(Óleo Sobre tela da autoria de
Elisabete Maria Sombreireiro Palma)
Agradecimento
Este quadro da autoria da minha esposa, que bem conhece a Póvoa, retrata e bem a vida deste bom povo. Obrigado è BETE
PÓVOA
Rogério Martins SImões
Se há algo que recordo são os lugares e as pessoas que me dizem qualquer coisa.
Recordo perfeitamente a Pampilhosa da Serra onde ia à feira, à missa e ao pão, com minha tia Laura Simões e a minha prima Almerinda Simões.
Lembro-me de irem todos juntos, juntos, sempre, como os da Póvoa.
Da Póvoa recordo tudo, ou quase tudo – menos os nomes dos mais velhos, mas, ainda os vejo como eles eram. É interessante que, depois de tantos anos, ainda tiro parecenças aos mais novos daqueles que bem conheci.
Nunca vi uma porta de casa fechada à chave e não havia notícia de por ali alguém roubar.
Roubar só se fosse algum coração de menina – eu era e sempre fui um apaixonado…
Tinha e tenho muitos amigos, na Póvoa, desse tempo menino. Corríamos todos os poços, todas as hortas, todos os caminhos. Fumávamos às escondidas cigarros feitos de capas e barbas de milho. Juntos éramos traquinas! Aprendi, com os da aldeia, a procurar restos de bombas de foguetes, que não tinham rebentado, e a sorte esteve pelo nosso lado quando as fazíamos explodir debaixo de uma pedra ou de uma lata.
Foi ali que aprendi a jogar às cartas e foram tão bonitos esses tempos.
Apesar de só lá estar três meses seguidos, em cada ano, fiz sempre muitos amigos entre os mais idosos. Gostava de trabalhar e de ajudar os outros. Às vezes estorvava! Mas apreciava tanto uma viagem num carros de bois do ti Manuel Mendes. Era tão meu amigo que chegou a emprestar-me um jumento para ir até Moninho.
Oh Laura! O garoto é trabalhador! Dizia o avô do César.
Era de facto trabalhador e estava sempre pronto para regar as hortas, tal como apanhar os girinos nas águas que escorriam da fonte velha a caminho do Polome. Junto ao Polome ferravam os animais de trabalho e ali perto enterravam as tripas das cabras para a festa do 3 de Setembro.
Depois recordo a chegada ao Polome e a visita dos que lá viviam. Lá estava sempre pronto para nos receber o TI-António do Vale Serrão. Perto de sua casa vi pela primeira vez o grão e existia o forno da telha.
As casas estavam quase todas ocupadas e as hortas tratadas.
O fumo da lareira saía pelas telhas ou pelos “janelos”
O galo cantava e as galinhas passeavam-se pelo mato que cobria os caminhos da aldeia.
Ainda sinto os cheiros, os sons, as cores, o calor do verão, a fonte velha e a sua água refrescante.
O Cântaro na casa da Eira, as panelas de ferro, a caçoila em cobre, o borralho e a braseira.
Como era gostoso ir para a Feteira apanhar figos,os abrunhos e os morangos que cresciam nas paredes da horta! As flores! Os cachos. As ginjas e as maças.
Como vêm estou marcado. Sou um poço de saudade!
Não! Não me entendam que a minha saudade é de um tempo que não volta, (mocidade perdida). É e será difícil entender quanto eu amo a Póvoa e as suas gentes – parentes.
A minha saudade são os afectos, as recordações de tanta gente boa que nem me atrevo a citar um só nome.
A minha saudade é de ter vivido em liberdade cimentando a minha formação e alicerçando em valores a minha vida. Aquela gente ensinou-me a dar e a receber. Ensinou-me a repartir e a não estragar o pouco que tinham. Aquela gente ensinou-me a amar.
Convidem-me para provar as filhós da aldeia e o bolo doce com uma folha de figueira a servir de forma. Comerei a sopa de feijão entulhada com couves e faceira de porco. Derreter-me-ei com o lombo de porco retirado da panela de barro e um pedaço de broa com presunto. E se tiver frio dormirei num palheiro ou no sobrado por cima do curral das cabras!
Agora tenho de ir! Não posso nem devo fazer esperar o povo. O povo não parte sem mim, nem eu parto sem o povo! Vamos todos com os da Póvoa!
(Fotografia actual da Póvoa, obtida hoje, pela arte do amigo Luís Gonçalves.
- Que inveja! Amigo Gonçalves! Então, ainda está à lareira? Que frio!
Nada há melhor que o calor humano, uma boa lareira e um bom medronho.
UM abraço para a Póvoa)
(Este sou eu! A alma é a mesma! O corpo está diferente, cresceu! As memórias são desse tempo menino!